Parecer do Sistema questiona projeto da Câmara de São Paulo sobre túneis de desinfecção

O Sistema CFQ/CRQs, através do Conselho Regional de Química da 4ª Região (CRQ IV), de São Paulo, apresentou parecer em relação ao projeto de lei 01-00342/2020, dos vereadores Camilo Cristófaro (PSB) e Rodrigo Goulart (PSD), que tramita na Câmara Municipal de São Paulo (SP).

A proposta dos vereadores se propõe a regulamentar o uso de túneis de desinfecção, com aspersão de produtos químicos sobre pessoas, como medida de prevenção à propagação do vírus responsável pela Covid-19. O parecer, produzido pela Comissão Técnica Química-Farmacêutica e Comissão Técnica de Saneantes do CRQ IV, segue a linha estabelecida pelas manifestações anteriores do próprio CRQ IV, do Conselho Federal de Química (CFQ) e da Associação Brasileira das Indústrias de Produtos de Higiene, Limpeza e Saneantes (Abipla), de que não existem estudos que garantam a eficácia da borrifação dos produtos químicos sobre pessoas como medida de combate à Covid-19 – seja no sentido de eliminar o vírus, seja no de oferecer garantias de que a prática não prejudica a saúde da população.

CRQ IV enfatiza uso de produtos em superfícies inanimadas

O Químico Industrial e doutor em vigilância sanitária Ubiracir Fernandes Lima Filho, que integra as comissões do CRQ IV, afirma que o parecer se propõe a questionar pontos do projeto. A proposta dos vereadores tendia ao apoio e à aprovação de apenas um determinado tipo de produto químico, o Cloridrato de Polihexametileno Biguanida. Isso contraria as recomendações da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) sobre outros produtos saneantes que podem substituir o álcool 70% na desinfecção de superfícies. Tendia também ao direcionamento a uma única categoria de empresa fabricante, caracterizando equivocadamente como responsável pela fabricação do produto uma empresa farmoquímica – excluindo todas as outras indústrias químicas tecnicamente habilitadas e legalmente autorizadas pela Anvisa para fabricação e fornecimento dos insumos daqueles sanitizantes.

“Um dos argumentos que constam no projeto, em defesa do produto químico, é de que ele tem autorização da Anvisa para ser utilizado. Mas a questão é que a autorização da Anvisa, ao uso como saneante, o limita à aplicação em superfícies inanimadas. É diferente de lançá-lo sobre a pele, com risco de contato com mucosas ou mesmo de inalação”, questiona Lima Filho.

Entre outros pontos, no parecer, há o alerta de que a limitação do projeto em torno de um único produto pode provocar problemas de abastecimento. O documento reitera que não há estudos científicos conhecidos comprovando a eficiência da aspersão de produtos sobre seres humanos. O próprio enquadramento desses produtos enfrentaria dificuldades pela dificuldade em defini-los como cosméticos, farmacêuticos ou saneantes.

Possíveis males a partir da absorção dos produtos através da pele também são considerados no parecer, que assinala que a transmissão da Covid-19 sabidamente se dá por vias respiratórias, não abrangidas pelos túneis de desinfecção – como risco adicional, o emprego dos túneis poderia oferecer ainda uma sensação falsa de segurança, induzindo a população a um previsível relaxamento quanto às medidas de isolamento e proteção, essas sim reconhecidamente eficazes.

Anvisa corrobora parecer enviado à Câmara de São Paulo

O parecer foi encaminhado à Anvisa. A agência se manifestou por meio da nota técnica nº 70, em que corrobora os pontos questionados pelo Sistema CFQ/CRQs  em relação à proposta dos vereadores paulistanos.

Na conclusão, a Anvisa afirma:

“Por todas as razões expostas, em nosso entendimento, a aplicação de produtos na ‘desinfecção de pessoas’ por meio de estruturas coma a preconizada pelo projeto de Lei da Câmara Municipal de São Paulo, não se mostra como uma ferramenta eficiente e que alcance os objetivos desejados, como é o caso das práticas mais simples e efetivas como a limpeza e desinfecção dos ambientes, da lavagem das mãos de forma frequente com água e sabonete ou da sua antissepsia com solução de álcool em gel 70%, bem como o uso de máscara fácil pela população em geral.”

O presidente do CFQ, José de Ribamar Oliveira Filho, destaca que o parecer do CRQ IV é mais uma etapa da ação do Sistema CFQ/CRQs que busca proteger a sociedade diante de medidas que ponham as pessoas em risco sem eficiência assegurada no combate à Covid-19.

“Desde a nota conjunta entre o Sistema e a Abipla, que foi acolhida pela Anvisa há alguns meses, temos estabelecido em nossa agenda a importância de questionar essas cabines ou túneis de desinfecção para zelar pela saúde dos brasileiros. Ficamos felizes em ver a maturidade dos profissionais da Química nesse debate, sempre em favor dos interesses do País”, afirma Oliveira Filho.

Conselheiro federal de Química e Chefe da Fiscalização do CRQ IV, Wagner Contrera Lopes lembra que a busca de cooperação com outros órgãos tem sido uma tônica no CRIG do CFQ; uma prática replicada em todo o Sistema CFQ/CRQs.

“A iniciativa das comissões técnicas do CRQ IV segue a mesma linha de atuação definida pelo CRIG, o Comitê de Relações Institucionais e Governamentais, do CFQ: o sentido é o de buscar uma aproximação com os órgãos de controle pra trabalhar na defesa dos interesses da sociedade. Esse episódio mostrou claramente os benefícios que a população obtém com essa atuação simbiótica entre o Sistema CFQ/CRQs e a Anvisa. Identificamos o problema, o levamos à autoridade de vigilância sanitária que tem a competência pra disciplinar o assunto e, em conjunto, conseguimos trazer aos vereadores de São Paulo uma posição técnica que possibilita a eles terem elementos pra avaliar o projeto, com mais fundamentos”, assinalou Contrera Lopes.

FONTE: CFQ Conteúdo publicado em 01/07/2020

 

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